A sobrecarga dos cuidadores de pacientes com Alzheimer





A Doença de Alzheimer é um desafio para os familiares e cuidadores. Pela própria natureza da doença que torna o portador cada vez mais dependente do seu redor, fica claro que o sofrimento da doença não se restringe ao indivíduo diretamente afetado e atinge os que estão à sua volta, modificando a vida de todos. Os vínculos afetivos mais fortes podem se desgastar pelas mudanças financeiras, sociais e psicológicas que a doença determina. Para um tratamento adequado da doença de Alzheimer, precisamos investir no paciente e também ficar atentos para os sinais de cansaço ou estresse emocional que afetam os cuidadores.

Existem muitos motivos para que ocorra uma sobrecarga nos familiares e cuidadores dos pacientes com Alzheimer. O aumento dos gastos financeiros com medicação, fraldas geriátricas, adaptações de acessibilidade, pagamento de cuidadores e até a retirada de um dos familiares do mercado de trabalho para prestar assistência é um dos muitos aspectos. Acompanhar uma doença crônica em seu caminho de deterioração inexorável, desmontando a pessoa que amamos pode dar a sensação de impotência e de fracasso. As mudanças comportamentais que chegam a tornar o idoso agressivo, inquieto, perambulando pela casa à noite ou gritando o dia inteiro podem fazer os cuidadores se questionarem o que fizeram para merecer essa pena. Muitas vezes, chegam a acreditar que o problema é pessoal e que o paciente faz certas coisas de propósito. Essa é uma visão distorcida que gera ainda mais dificuldades.
Nos serviços especializados no atendimento a portadores de Alzheimer fazemos periodicamente uma avaliação sistemática da sobrecarga dos cuidadores. A partir daí, tomamos medidas que podem ser voltadas ao melhor manuseio do paciente, orientamos tratamento da ansiedade ou depressão dos cuidadores e, quando se faz necessário, trazemos a discussão com os responsáveis sobre a possibilidade de transferir o paciente para uma clínica de idosos especializada em Alzheimer.
Apesar da abordagem ativa, continua sendo difícil o acesso aos sentimentos dos cuidadores. Não é raro que muitos passem por problemas sérios antes de procurarem ajuda médica. Temos vários exemplos dessas dificuldades e relataremos alguns.
Às vezes existe um certo embaraço por parte dos cuidadores em externar seu estresse pelo medo de "criar mais um problema" sobre a já complicada situação do paciente. 
Outras vezes o que predomina é a sensação de obrigação de cuidar do pai ou mãe doentes, sem poder esmorecer. Nessas situações, dar sinal de cansaço pode ser percebido pela própria pessoa como uma fraqueza ou incompetência em cumprir as obrigações filiais.
Existem também as situações em que são muitos irmãos intervindo no tratamento do paciente, mas apenas uma pessoa diretamente envolvida no dia-a-dia. O esforço de quem se dedica no cotidiano pode não ser devidamente apreciado pelos demais. O mal-estar de quem cuida efetivamente pode ser visto com descaso por aqueles que se revezam para visitar o doente nos finais de semana. Essa atitude leva a um encolhimento da pessoa sobrecarregada que, não tendo com quem se abrir, vai engolindo o quanto pode.
Não é infreqüente acontecer o oposto do que dissemos. Muitas vezes assistimos a cenários nos quais todos os irmãos se eximiram da responsabilidade e deixaram todos os cuidados para uma filha ou filho que assumiram tudo por não ter outra escolha. Como não têm para quem correr, acreditam que não podem se queixar porque o fardo é deles mesmo e não adianta reclamar. Aquele que ampara fica, ele mesmo, desamparado.
Pode ser que algumas vezes as condições sejam ideais para o tratamento, mas ainda assim há dores e sofrimento. A família pode ter recursos financeiros para absorver os custos da doença. Os filhos do paciente podem ser companheiros e se revezarem efetivamente nos cuidados. O indivíduo doente pode receber o melhor tratamento médico, ajudando a controlar os sintomas comportamentais. Todavia, permanecem elementos desconcertantes e que abalam emocionalmente as pessoas próximas.
Para ilustrar, lembramos a primeira fase que precede o diagnóstico. Nela os familiares convivem com um indivíduo doente sem se darem conta do problema e de sua dimensão. De acordo com a dinâmica da família ou sendo o paciente uma figura forte, fica difícil desautorizar suas atitudes ou fazê-lo reconhecer que não se encontra tão apto para tomar decisões. Dependendo do grau de dominância, o cônjuge e os filhos chegam a se recusar a reconhecer que exista algo de errado até que muitos danos tenham se sucedido.
Outro momento difícil é o da abertura do diagnóstico. A aceitação de uma patologia sem tratamento curativo e a perspectiva de um desenrolar longo e penoso pode não ser complexa e leva à busca de várias opiniões médicas e de tratamentos alternativos de todos matizes. A partir do momento em que a confirmação do problema ocorre, surgem também as questões de cunho legal como a administração dos bens do paciente que deve ser feita em seu benefício por alguém capaz e íntegro.
Ao longo do tempo, com a desestruturação das funções cognitivas e com as alterações de comportamento, os familiares testemunham a gradual desmanchar da personalidade que aprenderam a amar e a respeitar durante a vida. Enfrentar a dependência do pai ou da mãe, cuidar do asseio íntimo, do banho e do vestir também requer ultrapassar a barreira do pudor. Existem os que o fazem pela via da despersonalização, cultivando um certo distanciamento emocional dessas questões nos momentos de execução das tarefas. Outros, seguem pela via do amor e encaram o problema por meio da compaixão. De qualquer forma, o obstáculo precisa ser superado.
Existem ainda uma infinidade de situações que não conseguimos descrever nesse breve espaço, como a privação de sono contínua para cuidar do doente, a perda da privacidade e da vida afetiva em outras esferas, e tantas outras que aprendemos a conhecer e reconhecer com nossos pacientes. O fato é que aqueles que passaram pela experiência de ser cuidador de um paciente com Alzheimer, esses se sentem como tendo feito uma faculdade inteira sobre o problema, tamanha a experiência que acumularam. Mas para alcançar o sucesso nessa jornada é preciso saber pedir ajuda e contar com o auxílio dos profissionais e com a experiência de quem passou por algo semelhante. Aos novatos informamos: a tarefa é grande, mas com as ferramentas certas é possível executá-la.

Fonte: http://www.doutorcerebro.com.br/

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